terça-feira, 31 de julho de 2012

A morte de Chris Marker


Morreu, aos 91 anos de idade, um grande cineasta: Chris Marker.
Lembro que a Fnac tem à venda uma sublime edição em DVD (Atalanta): dois DVDs com três filmes de Chris Marker, cineasta experimental que há um ano foi alvo de uma importante retrospectiva no Estoril Film Festival. O preço é bastante simpático: 19,99€. Só não comprei esta edição porque já tenho os filmes essenciais de Marker que adquiri na Amazon:  "Sans Soleil" e "La Jetée".
--------
Mas afinal quem foi Chris Marker?
Nasceu em França em 1922. Combateu na 2ª Guerra Mundial, estudou filosofia com Jean Paul Sartre e Guy Debord mas especializou-se em documentários, tendo sido ainda produtor, escritor, operador de câmara, artista multimédia e jornalista.
Jean-Luc Godard, Orson Welles, Federico Fellini, Pasolini, Chantal Akerman, Wim Wenders, Werner Herzog, Errol Morris, Abbas Kiarostami, e Agnès Varda diziam que Marker era um dos melhores cineastas do mundo - um "ensaísta das imagens". Trabalhou com Alain Resnais no sublime documentário sobre Auschwitz - “Noite e Nevoeiro” (1955). Deu muito poucas entrevistas ao longo da vida e quando lhe pediam uma fotografia, dava a do seu gato Guillaume.
Marker realizou em 1962 um dos mais enigmáticos, originais e belos filmes de sempre: "La Jetée". É um filme de ficção científica (aborda dois temas recorrentes: o holocausto nuclear e a viagem no tempo), feito com imagens estáticas, fotografias filmadas, à excepção de um único movimento. Se o cinema permite uma sofisticada manipulação do tempo através da montagem, "La Jetée" demonstra que mesmo imagens estáticas são capazes de fluir e de se submeter ao transcorrer do tempo. Mas este é apenas um dos trunfos estéticos desta obra maior do cinema mundial. A poesia das imagens, a soberba montagem, a história envolvente, a voz off subtil, fazem deste filme uma experiência artística única.

As novas gerações talvez saibam da existência do filme porque "La Jetée" de Marker inspirou o filme que Terry Gilliam (ex-Monty Python) fez em 1995, "12 Macacos", com Brad Pitt e Bruce Willis. O realizador Terry Gilliam diz mesmo que "La Jetée" de Marker “tem a melhor montagem que alguma vez viu, com a música e a voz a marcar o ritmo e a deslumbrar o espectador”. As influências estéticas e plásticas do filme de Chris Marker perduram até aos dias de hoje, não só no seio do próprio cinema, como na música, na fotografia e nas artes plásticas.
No caso da música, David Bowie tem um vídeo intitulado “Jump They Say” com referências directas ao filme de Marker; o grupo de jazz Chicago Underground Trio e os Isotope 217 têm um disco chamado "La Jetée" (1999 e 1999, respectivamente); o projecto de pós-rock Tortoise editou um disco intitulado "Jetty" (1998).
Em 1982, Chris Marker realizou outra obra seminal,“Sans Soleil”, que resultou numa complexa reflexão sobre a cultura da imagem na sociedade pós-moderna – filme, vídeo e fotografia. E voltou a abordar os seus temas de eleição: ficção científica, memória, tempo, viagem, culturas de África e Japão.
Chris Marker realizou, nos seus últimos anos de trabalho, um notável documentário sobre a vida do realizador russo Andrei Tarkovski - "One Day in the Life of Andrei Arsenevitvh" (2000) e em 2005 criou um trabalho multimédia e digital para o MoMa – Museu of Modern art de New York.

domingo, 29 de julho de 2012

Notas de Bresson #19

"Respeitar a natureza do homem sem a querer mais palpável do que ela é".

"Straw Dogs" no grande ecrã

1971 foi um ano particularmente fértil na produção de filmes sobre a violência: “Dirty Harry” de Don Siegel (com o implacável polícia interpretado por Clint Eastwood), o icónico “A Laranja Mecânica” de Stanley Kubrick e “Straw Dogs – Cães de Palha” do mestre (maldito) Sam Peckinpah.
Os dois últimos filmes foram banidos e censurados ao longo de décadas, inclusive, em países ditos liberais como a Inglaterra e os EUA pela sua violência explícita e estilizada. “Cães de Palha” é um impressionante manifesto sobre a violência, sem moralismos facciosos. É a história de um homem comum, um professor de matemática interpretado por um perturbante Dustin Hoffman, que vai viver para o campo com a sua mulher no intuito de encontrar sossego para o seu trabalho. Acontece que, a partir de dado momento, os habitantes da aldeia invadem o território do casal e inicia-se uma incrível espiral de violência gráfica e realista (como a sequência da violação, à data altamente polémica e ousada). É também um filme sobre como um cidadão comum reage sob extrema pressão psicológica face a situações de brutal e crescente adversidade. Um estudo sobre o lado mais animalesco da mente humana com um toque tão radical e pessoal quanto o do Sam Peckinpah (uma das maiores influências, por exemplo de Quentin Tarantino).
Vem isto a propósito do facto deste filme de culto ser exibido, dia 30 de Julho, na Cinemateca Portuguesa. Sugiro ainda a leitura da acertada crítica de Luís Mendonça no blog À Pala de Walsh.

sábado, 28 de julho de 2012

Atrás das Cenas #2

"Godzilla" (1954) - Ishirô Honda

Pela Cultura!

Os espanhóis continuam a lutar contra as medidas de austeridade impostas pelo Governo de Mariano Rajoy. Tudo porque o primeiro-ministro espanhol decidiu aumentar o valor do IVA na cultura, que passará de 8% para 21%. Este facto tem levantado uma onda de protestos em Espanha, não só por parte da população, mas também e sobretudo, pelos agentes culturais, artistas, actores, músicos, escritores, realizadores, etc. Todos os dias, na imprensa e nos diferentes órgãos de comunicação social, os artistas exprimem a sua voz contra este aumento brutal do IVA, que consideram que irá prejudicar gravemente a dinâmica cultural espanhola.
Várias manifestações foram organizadas para contestar esta medida do governo espanhol, e numa das últimas esteve uma cara bem conhecida do cinema, o actor Javier Bardem que, apesar de se considerar um privilegiado por filmar em Hollywood, não deixou de se solidarizar com a comunidade artística de Espanha. O mesmo fez o mais famoso cineasta espanhol, Pedro Almodóvar, que encabeça o movimento  "Por La Cultura", juntamente com dezenas de figuras de destaque da cultura espanhola.
E o que tem acontecido em Portugal? Tirando uma tímida petição online de contestação pelas duras medidas contra a cultura e uma manifestação fugaz à frente do Parlamento (apenas do mundo do cinema), nada mais houve de relevante. Por cá, a letargia continua. Mas como um cartaz espanhol refere: "Cultura não é um luxo".

quinta-feira, 26 de julho de 2012

"Samsara" a caminho

Nem de propósito: escrevia eu no último post sobre o filme "Baraka" e eis que hoje é lançado o segundo trailer oficial do novo (e esperado) filme do mesmo realizador, Ron Fricke: "Samsara"
Trata-se de uma nova viagem multicultural sobre o nosso mundo, uma vez mais filmado com grande rigor estético, em 25 países diferentes e durante 5 longos anos. 
Mas a maior novidade é mesmo esta: Ron Fricke filmou num formato que já não se usa: 70mm, o maior formato possível para ver em ecrãs gigantes (de forma a que a experiência audiovisual seja totalmente imersiva). Outra novidade interessante é que a banda sonora é da responsabilidade de uma das metades do duo Dead Can Dance, a fantástica cantora Lisa Gerrard
O trailer dura apenas 1 minuto, mas tem imagens de uma beleza estonteante, o que antecipa um documentário visualmente fascinante. 
"Samsara" estreia em sala já em Agosto nos EUA.

A arte e o seu contexto

Esta é uma experiência quase ready-made à Duchamp: retirar do contexto formal de uma sala de concerto um violinista famoso e consagrado e colocá-lo a tocar, anonimamente, numa estação de metro. Para quê? Para perceber que a valorização artística que qualquer pessoa faz de um determinado fenómeno ou acto depende, e muito, do contexto em que este ocorre. O vídeo em baixo descreve-se em poucas palavras: alguém entra na estação do metro de Washington, vestindo jeans, camisa e boné, encosta-se próximo à entrada, tira o violino da caixa e começa a tocar com entusiasmo para a multidão que passa por ali, na hora de ponta matinal. Como quase sempre acontece, os transeuntes ignoraram a interpretação violinística do músico durante 45 minutos de actuação
O interessante vem agora: o músico que tocava não era nenhum músico de 3ª categoria a tentar sacar umas moedas para comprar um Big Mac. Era, simplesmente, aquele que é considerado como um dos melhores violinistas mundiais: Joshua Bell, executando peças musicais consagradas, num instrumento raríssimo e valiosíssimo, um esplendoroso Stradivarius de 1713, estimado em mais de 3 milhões de dólares.
Alguns dias antes, Bell tinha tocado no Symphony Hall de Boston, onde os melhores lugares para os espectadores custam a bagatela de 1000 dólares. Esta iniciativa foi realizada pelo jornal The Washington Post há uns anos e a intenção era a de lançar um debate sobre três tópicos intimamente ligados: valor, contexto e arte. O Washington Post concluiu que o virtuoso violinista Joshua Bell era uma obra de arte sem moldura. Um artefacto de luxo sem etiqueta de marca. Talvez. As convenções sociais ligadas à apreciação estética são orientadas para dar mais valor ao contexto do que ao conteúdo e à forma. Repare-se:

O que gostaria era de ver uma experiência ao "contrário": um músico amador e sem currículo a tocar com uma grande orquestra numa grande instituição consagrada à fruição erudita das elites bem pensantes. O contexto estava definido, a arte bem enquadrada. E o valor? Dependeria dos dois primeiros pressupostos? Pois...

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Sopro de vida


"Baraka" é uma palavra sufi que significa "Sopro de Vida" ou "Benção".
E "Baraka" é um sublime documentário (1992) sem legendas nem narração em voz-off (no estilo da obra-prima "Koyaanisqatsi" de Godfrey Reggio) sobre a natureza e a condição humana no planeta Terra, revelando os contrastes entre civilizações muito diferentes.
No fundo, é um filme que enaltece a humanidade (mesmo que mostre a destruição e a degradação humanas) e a relação entre distintas raças, religiões, línguas e culturas. Realizado por Ron Fricke (ex-director de fotografia de "Koyaanisqatsi"), "Baraka" é um hipnotizante poema visual filmado em estilo "time-lapse" e "super slow-motion", no qual as imagens incluem rituais religiosos, maravilhas naturais, processos de mecanização e diversos estilos de vida. Sendo um documentário visual, a música desempenha um papel fundamental, desde logo, com a fabulosa música original de Michael Stearns; depois, com a inclusão do clássico tema "The Host of Seraphim" dos Dead Can Dance.
Particularmente impressionante é esta sequência de 6 minutos e 39 segundos: um ritual religioso (não consegui identificar a origem) seguido de espantosas imagens da natureza. Superiormente filmado, com uma leveza e elegância estética a toda a prova, "Baraka" em geral e esta sequência em particular, influenciaram grande parte da linguagem visual dos documentários, reportagens e publicidade dos últimos 20 anos. 
Pegando no significado do título do filme, é um portentoso "sopro de vida" e um hipnótico sopro de cinema.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Entrevista Póstuma (13) - João César Monteiro

O Homem Que Sabia Demasiado - O filme que obteve maior sucesso foi "Recordações da Casa Amarela", visto por  quase 40 mil espectadores.
João César Monteiro - Sim, mas a minha atitude é sempre a mesma: nas tintas para o público. Afinal de conta, é um filmezinho...
O Homem Que Sabia Demasiado - Afinal, que tipo de cinema e de cineastas lhe interessam?
João César Monteiro - Há, de facto, duas ou três dezenas de bons cineastas espalhados pelo mundo, desde Taiwan até Tiblissi, passando quiçá por Lisboa, o Canadá e mesmo a América. É esse cinema que a mim me interessa e não outro qualquer, nem essa coisa artificial que é o cinema europeu. Europeu? Então e os africanos? E nós, somos europeus de que lado? Nós a única coisa que temos virado para a Europa é o cu.
O Homem Que Sabia Demasiado - Mas esse é o tipo de cinema que raramente se consegue ver na exibição comercial.
João César Monteiro - Pois é, e não admira, dada a selvajaria que se tornou a exibição do cinema em Portugal. Eu gosto de ver filmes. Mas filmes que sejam cinema, e não fogo-de-artifício. A maior parte dos filmes hoje produzidos são só merda... merda... Mas talvez eu já esteja a divagar...
O Homem Que Sabia Demasiado - Porque é que escolheu o cinema como forma de expressão artística, conehcendo a sua paixão pela poesia e pela literatura?
João César Monteiro - É uma pergunta ingrata. Porque é que se escolhe uma coisa e não se escolhe outra?!
O Homem Que Sabia Demasiado - O seu cinema sempre foi considerado de autor, inconformado, irreverente, facto que as más línguas gostavam de criticar.
João César Monteiro - Eu quero é que as más línguas se fodam!
O Homem Que Sabia Demasiado - Mas... Porque é que...
João César Monteiro - E quero também que o senhor se foda e não me chateie mais com perguntas idiotas!

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Acertou ao lado

A cena passa-se no estimável filme "Ghost World" (2001) de Terry Zwigoff
Cenário: um videoclube.
Um senhor de meia idade pergunta ao empregado:
- "Tem o filme '8 1/2'?"
- "Humm... vou procurar na base de dados do computador... Ah, aqui está! '9 1/2 Weeks' com Mickey Rourke. Estava na secção de drama erótico."

A estreia de "Metropolis"

Imagem: 10 de Janeiro de 1927, Berlim: estreia mundial do filme "Metropolis" do mestre e visionário alemão Fritz Lang. Filme futurista e pessimista, filme absorvente e revolucionário.
Para saber tudo, mas tudo, sobre esta obra expressionista tão influente na história do cinema, é favor explorar este fantástico site dedicado ao filme de Lang.

domingo, 22 de julho de 2012

Zorn & Patton

O regresso em grande em disco de dois dos mais interessantes músicos contemporâneos: John Zorn e Mike Patton. O álbum foi recentemente editado e dá pelo título "Templars: In Sacred Blood" (editado pela editora Tzadik de Zorn). A música deste álbum é permanentemente desafiadora: mistura pop, rock, jazz, étnica e prog-rock. Os músicos são de excepção: Joey Baron na bateria, Trevor Dunn no baixo, John Medeski no órgão Hammon, e Mike Patton na voz.

PS - Gosto quando os meus posts provocam reacções opostas: 2 "Interessante", 1 "Fantástico" e 2 "Desinteressante". Haja pluralidade de opinião!

sexta-feira, 20 de julho de 2012

"À Pala de Walsh"

É raro haver bons sites de cinema em Portugal. Sites que não se preocupem apenas em reproduzir as notícias que todos os sites de cinema reproduzem. Faltam sites que procurem reflectir sobre a essência do cinema, ao mesmo tempo acompanhado a actualidade (estreias, novidades...) mas sobretudo, abordando temáticas que forçam a discussão sobre as várias facetas que a Sétima Arte representa.
O nome do site é todo um achado: "À Pala de Walsh". Um inspirado trocadilho fazendo uma referência directa ao cineasta clássico Raoul Walsh. Os autores do site são Carlos Natálio, João Lameira, Luís Mendonça e Ricardo Vieira Lisboa, jovens cinéfilos (alguns já tinham blogues de cinema) amantes da boa arte cinematográfica, da escrita e da partilha de conhecimentos.
"À Pala de Walsh" está agora apenas no início, mas já revela bons indicadores de grande interesse, com crónicas pertinentes sobre os mais variados temas (a importância da crítica de cinema, o cinema e a praia, críticas a filmes, etc).

Playtime #77


A solução: "Audition" (1999) - Takashi Miike
 Quem descobriu: Sérgio Mendes

quinta-feira, 19 de julho de 2012

A colecção Monty Python

Em Portugal, as melhores colecções de filmes em DVD nos últimos anos (de iniciativa dos jornais) tem sido da responsabilidade do jornal Público. As colecções deste jornal manifestam critério rigoroso e instinto de qualidade ao mais alto nível: filmes de culto, clássicos intemporais, cinema independente contemporâneo, etc.
Por isso, a nova colecção promete ser histórica, uma vez que se trata de editar 7 DVDs (todas as sextas, a partir de amanhã, 20 de Julho, por apenas mais 2,99€) contendo a primeira serie televisiva "Malucos do Circo" ("Monty Python Flying Circus") dos Monty Python, verdadeiro manifesto do humor revolucionário e "non sense" que iria caracterizar a obra destes "terroristas do humor britanico". Imperdível para fãs dos Monty Python (John Cleese e companhia) e imperdível para quem quer começar a conhecer o humor surrealista deste colectivo ímpar de humoristas.
Porque, afinal de contas, como o titulo desta colecção indica, "O humor nasceu com os Monty Python".

Chaplin e Bergman: dois livros

São dois livros que descobri na livraria Bertrand, colocados estrategicamente um ao lado do outro (para chamar a atenção do leitor mais cinéfilo): "Chaplin: Os Primeiros Anos" (Ed. Bizâncio) de Stephen Weissman e "A Lanterna Mágica" (Ed. Relógio D'Água) de Ingmar Bergman.
O primeiro livro apenas folheei e pareceu-me muito interessante porque centraliza a sua análise na vida e obra de Chaplin durante a primeira década do século XX, descortinando histórias quotidianas de criança e da difícil ascensão ao estrelato.
Já sobre o livro "A Lanterna Mágica", conheço bem porque já tinha uma edição antiga deste título. Trata-se da magnífica e imperdível autobriografia do realizador sueco, que comentei num post anterior, exactamente aqui. Visto que são raras as boas edições de livros de (e sobre) cinema em Portugal, eis duas boas propostas de leitura para este verão. Para o cinéfilo e não só.

Dois momentos de Hitch

1) Hitchcock empilha uma torre de dossiers com os argumentos dos seus filmes.
2) Vincent Price estrangula Alfred Hitchcock.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

A lista cinéfila de DiCaprio

Não nos deixemos iludir com os gostos dos actores do star system de Hollywood. Nem sempre o que parece é. O famigerado Leonardo DiCaprio, actor em ascensão e afirmação continuada, outrora símbolo sexual juvenil, veio ao mundo revelar os seus gostos cinematográficos. Ou seja, os seus filmes preferidos de sempre. 
Para tal, escolheu 10 títulos do cinema mundial. Convenhamos que, surpreendentemente ou talvez não, se trata de uma belíssima lista, repleta de obras-primas incontestadas:

- "Ladrões de Bicicletas" (1948) de Vittorio de Sica
- "Taxi Driver" (1976) de Martin Scorsese
- "Lawrence da Arábia" (1962) de David Lean
- "8 1/2" (1963) de Federico Fellini
- "O Terceiro Homem" (1949) de Carol Reed
- "Yojimbo" (1961) de Akira Kurosawa
- "Sunset Boulevard" (1950) de Billy Wilder
- "The Shining" (1980) de Stanley Kubrick
- "A Leste do Paraíso" (1955) de Elia Kazan

segunda-feira, 16 de julho de 2012

O que diz Haneke


Enquanto esperamos pela estreia nacional do novo filme de Michael Haneke, "Amour", recordo algumas ideias que o cineasta austríaco proferiu há dois anos a um jornal espanhol. São palavras que ajudam a compreender as opções formais e de conteúdo do seu cinema.


Tem uma visão desesperada da Humanidade?
Não. Por vezes perguntam-se se todos os meus filmes falavam sempre do mesmo e eu disse que representavam a guerra quotidiana entre os seres humanos. A guerra entre o casal, entre amigos ou entre filhos e pais. Essas pequenas guerras do dia-a-dia podem levar a uma guerra maior. Não têm necessariamente uma consequência imediata, mas acredito firmemente que várias gerações que desenvolvem pequenas guerras desembocam, mais cedo ou mais tarde, numa guerra geral.

Como descreve o seu cinema? Terror? Thriller? Realista?
Tenho elementos de filmes de terror ou de Thriller (como em "Funny Games"), mas o meu estilo é, exactamente, realista. Eu sou um realista. Por isso não usei música em "O Laço Branco", porque na vida real não existe banda sonora de fundo - só há música quando um personagem ouve um CD ou alguém a cantar. Muita gente me pergunta porque é que me fascino com o lado obscuro dos seres humanos e a verdade é que não é assim. Quando tento ser realista, ao retratar os seres humanos encontro sempre esses elementos obscuros da natureza humana. A realidade tem um lado obscuro. Não tenho outro remédio que lidar com isso. Por isso quase todos os meus filmes têm violência e crueldade, mas não é algo que procuro deliberadamente.

Porque é que nunca fez comédias?
Pela mesma razão que não se pede a um sapateiro que faça um chapéu. No entanto, adoro as comédias inteligentes e desfruto muito com os filmes do Woody Allen. Não há muitas comédias boas na história do cinema.

domingo, 15 de julho de 2012

Os melhores filmes jamais feitos

Ja escrevi aqui acerca de um conjunto de dez filmes de realizadores famosos que nunca foram concretizados. 
Ora, o site List Universe publica uma lista que vai ao encontro do que já tinha publicado: "Top 10 Greates Movies Never Made". O título desta reportagem diz tudo, mas basicamente são projectos que ficaram apenas no papel de realizadores como Akira Kurosawa, Stanley Kubrick, Orson Welles ou Bernardo Bertolucci. Ou Francis Ford Coppola, que em tempos manteve o desejo de fazer o ambicioso filme "Megalopolis" (esboço do filme na imagem). 
Vale a pena conhecer a lista.

Atrás das Cenas #1

"Psycho" (1960) - Alfred Hitchcock




sábado, 14 de julho de 2012

Os filmes de Chaplin

Geraldine Chaplin, actriz e filha de Charlie Chaplin, disse um dia que a última vez que viu o pai vivo estava a ver um filme de Jerry Lewis e a a rir-se desalmadamente. Geraldine ficou com uma imagem doce do último momento em que viu o pai vivo: o rei da comédia a rir-se de um actor e realizador (também ele) cómico. O humor como elo de ligação artística e emocional entre dois grandes artistas.  
Geraldine Chaplin referiu também que o pai tinha uma predilecção muito especial por "2001 - Odisseia no Espaço" (1968) de Stanley Kubrick. A tal ponto que o viu várias vezes na sala de cinema.
O próprio Charlie Chaplin, questionado sobre os seus filmes favoritos, comentou que adorava "Sunrise" (1927) de Murnau (foi uma influência para "City Lights") e "O Couraçado Potemkine" (1925) de Sergei Eisenstein, que considerava o melhor filme jamais realizado.




sexta-feira, 13 de julho de 2012

Falta papel higiénico no quarto 237

Há certos fanáticos do cinema que chegam a escalpelizar, ao mais ínfimo pormenor, os filmes de que gostam mais. É o caso de John Fell Ryan, músico de vários projectos musicais alternativos, que se diz obcecado com o filme "The Shining" de Stanley Kubrick
A tal ponto que - digo eu - o seu passatempo favorito deve ser visionar o dito filme fotograma a fotograma, com o recurso inevitável do comando (play e pausa). Só desta forma John Fell Ryan conseguiria descobrir pormenores do filme que só surgem numa fracção de segundos durante o filme. Convém dizer que a obra de Kubrick em geral, e "The Shining" em particular, já foram analisados detalhadamente por estudiosos e cinéfilos. E quanto ao filme interpretado por Jack Nicholson, é sabido que há várias interpretações que indicam haver sinais místicos, simbólicos e herméticos na expressão visual do filme.
O autor da análise a que me refiro, chega ao pormenor de referir que não havia papel higiénico no quarto 237 (na imagem), que Wendy muda a faca da mão esquerda para a direita e vice-versa, que as árvores do cenário exterior ao Overlook Hotel mudam de posição ou que as pinturas nas paredes do mesmo hotel são estranhas formas místicas com significados obscuros. E para demonstrar o seu ponto de vista, o autor recorre a fotogramas específicos.
Enfim, no fundo, são meras curiosidades que interessam aos fãs de Kubrick e de "The Shining".
Aqui o link.



A t-shirt

É como se tivesse voltado à época militante da adolescência: comprei a mítica t-shirt "Unknown Pleasures" dos Joy Division. Claro que fiquei muito mais orgulhoso depois de saber que a actriz Kristen Stewart se passeia com uma igual.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Discos que mudam uma vida - 167

Radiohead: "Kid A" (2000)

Klaus Kinski dixit


Um dos actores mais expressivos de sempre, Klaus Kinski, era tido como irascível e de mau génio (chegou ao confronto físico com o realizador Werner Herzog).

Eis algumas das suas tiradas mais interessantes:

"Eu faço filmes por dinheiro. Exclusivamente por dinheiro. Vendo-me pelo mais alto dinheiro, exactamente como uma prostituta. Não há nenhuma diferença. Por isso gostava de ganhar um dia o Prémio Nobel. Vale 400 mil dólares!"

"Prefiro andar de táxis. Detesto limunises. Cheiram mal e os seus condutores conduzem pessoas mortas aos seus cemitérios".

"Podia estar na cama com uma mulher durante semanas, mas sempre me pareceriam três segundos. Ou 300 anos".

"As dimensões dos meus sentimentos são demasiado violentos. Detesto filmar sem intervalos. Por isso gritei com o Herzog e bati-lhe. Mais do que tudo, gostava que Herzog apanhasse a peste".

"Eu sei que tenho dentro de mim a alma de milhões de pessoas que viveram em séculos passados. Não apenas de pessoas, mas também de plantas, animais, coisas, e até matéria. Todas estas coisas existem em mim".

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Seamus Murphy e PJ Harvey

Depois de conhecer o trabalho do fotógrafo Seamus Murphy numa exposição, PJ Harvey convidou o artista para realizar os vídeos de todas as doze canções deo álbum “Let England Shake” (2011). Seamus não possuía nenhuma experiência com vídeos ou música, mas aceitou o desafio. Com experiência na reportagem fotográfica de áreas de conflito actual (sobretudo Médio Oriente), o fotógrafo foi escolhido para realizar um complemento visual ao magnífico disco de Polly Jean Harvey. Seamus Murphy nasceu em 1959 na Irlanda e actualmente vive em Londres. Durante duas décadas foi fotojornalista na Europa, Médio Oriente, Ásia, África e América Latina.
Inspiradas em cada uma das 12 composições do disco de PJ Harvey, Seamus Murphy realizou uma curta-metragem de complemento visual à música. Os filmes contêm imagens de uma viagem de carro feita por Seamus Murphy um pouco por toda a Inglaterra, procurando retratar alguns aspectos do país, bem como situações reais e espontâneas no contacto com as pessoas e as suas vidas. Desta forma, estes dois artistas colaboraram em conjunto para criar algo diferente e que pudesse mostrar a visão de ambos sobre o país e o povo inglês, numa série de mini filmes inspirados nos temas de “Let England Shake“. São retratos bastante intuitivos, envolvendo declamações de versos das canções, imagens da cantora e da sua banda a tocar, misturando imagens de uma Inglaterra bucólica, misteriosa e antiquada/moderna. Um acompanhamento que se funde de forma mágica e acaba por complementar o trabalho dos dois artistas de forma surpreendente.
O fotógrafo explica: “Eu fiz estas doze curtas-metragens para acompanhar as doze músicas de PJ Harvey, mas nunca quis interpretar o álbum, mas sim captar qualquer coisa da sua atmosfera e da sua força. Quis olhar para o enigma da Inglaterra, para a sua mentalidade e a sua difícil relação com a história do passado. Fi-lo como uma viagem que se tornou numa espécie de diário de paisagens e de sensações”. Não sei se Seamus Murphy, essencialmente fotógrafo, irá no futuro continuar a trabalhar como realizador depois desta experiência. Mas nada surpreenderia que assim fosse, dada a qualidade plástica do trabalho já consumado.
-----
Todos os 12 pequenos filmes estão editados em DVD e publicados no Youtube. De toda a série de curtas-metragens, a minha favorita é esta:

terça-feira, 10 de julho de 2012

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Nicholson de outra perspectiva

Na sequência das imagens do post anterior sobre fotografias de produção no set de filmagens de filmes de Stanley Kubrick, descobri agora uma fotografia magnífica, também de um filme mítico de Kubrick, "The Shining" (1980). 
Trata-se de uma fotografia que revela, numa perspectiva lateral, a forma como o pescoço e cabeça de Jack Nicholson se mantiveram imóveis para a imagem frontal que surge no final do filme (imagem em baixo). Ou seja, o momento em que a personagem Jack Torrance morre no labirinto de neve. No filme só surgia um único plano fixo frontal, mas a verdade é que, segundo dados de produção, a preparação dessa cena não foi fácil. Kubrick queria que Nicholson estivesse totalmente imóvel e num determinado ângulo. Para tal, concebeu-se um sistema de madeira e esferovite para acomodar a cabeça do actor e não a mexer. 

sábado, 7 de julho de 2012

Incompreensivel

Confesso que não compreendi o alcance da crítica que foi publicada na revista de cinema Premiere a propósito do filme "O Cavalo de Turim" de Béla Tarr. Num tão pequeno texto encontram-se contradições ("pretensioso, mas repleto de planos belíssimos"), abordagens dúbias ("este filme é bastante problemático") e dislates incompreensíveis ("talvez funcionasse melhor num museu do que no cinema"):

"Este filme húngaro, vencedor do Urso de Prata na Berlinale de 2011, é bastante problemático. Objecto de um cinema art house digno de festival, 'O Cavalo de Turim' é um filme que goza de uma fotografia e de uma técnica cinematográfica esplêndidas, mas cuja concretização é demasiado penosa para ser apreciada. Apesar de ser uma reflexão interessante sobre a inevitabilidade da morte, metaforizada na figura do cavalo, o filme aprece ter sido feito para ser celebrado pela pureza rígida da sua arte. Pretensioso, mas repleto de planos belíssimos, talvez funcionasse melhor num museu do que no cinema"
Ana Luís Pinheiro, Premiere

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Ver filmes no PUFF

Só o nome deste festival de cinema é um achado: PUFF - Portugal Underground Film Festival. Vai decorrer em duas cidades longe de Lisboa e do Porto: Portimão e Fundão.

Eis a informação:

O PUFF é um festival internacional de cinema com um conceito inovador em Portugal: o PUFF não se realiza apenas num local, mas sim em várias cidades nacionais em simultâneo (que não Lisboa e Porto), promovendo assim uma descentralização do acesso à cultura. 

O PUFF pretende trazer a Portugal uma nova forma de "olhar" filmes diferentes, alternativos e experimentais, inéditos em Portugal. Sendo que o "projeto mãe", 1P2L Produções Independentes tem por objetivo principal o de promover Portugal como local ideal de rodagem, este festival pretende, por um lado, trazer filmes diferentes a um público que não tem acesso a eles habitualmente, mas também o de mostrar Portugal como país variado às equipas estrangeiras que vêm ao festival para promover os seus filmes. 

O festival O PUFF quer trazer a Portugal todo o tipo de filmes ditos "underground". Produções alternativas, experimentais de ficção ou documental, curtas ou longas, que dificilmente chegariam às salas num percurso convencional. 

O PUFF pretende "correr" o país por várias cidades anualmente num período médio de 10 dias no início do mês de Junho. Essas cidades terão as mesmas projeções, mas com agendamentos diferentes.
-----
Mais informação aqui.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Jake LaMotta imortal

Ontem revi no Canal Hollywood o sublime "Raging Bull" (1980) de Martin Scorsese. É sempre um prazer rever um filme tão superiormente realizado e interpretado. Robert De Niro e Joe Pesci têm, de facto, os papéis das suas carreiras nesta louca ascensão e queda do pugilista Jake LaMotta
Isto para dizer que, na minha mais sincera humildade, julgava que o verdadeiro Jake LaMotta já tinha falecido, uma vez que se tornou profissional do boxe no longínquo ano de 1941! 
Quando fui efectuar uma rápida pesquisa no Google para saber a data da morte, eis que fui colhido de total surpresa: Jake LaMotta está bem vivo aos... 90 anos de idade! 
Mais: não só está vivo como ainda "pratica" pugilismo. Quer dizer, simula que pratica pugilismo, uma vez que, com a idade que tem, pouco mais faz do que movimentar (com esforço) os braços numa vã tentativa de pose à boxeur. Seja como for, é de louvar a atitude pro-activa desta verdadeira lenda do pugilismo mundial que ficou imortalizada no magnético filme de Scorsese.

Perguntas Indiscretas #41

O cinema clássico de Hollywood está polvilhado de actrizes belas, sensuais, carismáticas e charmosas. Em suma, mulheres fatais ou Divas, como hoje já não há. 
Exemplos? Lana Turner (na imagem), Audrey Hepburn, Gene Tierney, Kim Novak, Ingrid Bergman, Bette Davis, Lauren Bacall, Rita Wayworth, Maureen O'Hara, Jane Russell, entre muitas outras.
Mas a ter de escolher uma só actriz que encarnasse todas as características de Diva (talento, beleza, sensualidade, charme), qual seria a vossa escolha?

Jim Morrison - 41 anos depois

Há precisamente 41 anos, morria uma das figuras musicais mais emblemáticas e influentes da história do rock: Jim Morrison. Oportunidade para ver (ou rever) o excelente documentário "The Doors: When You're Strange" (2009). 
Realizado por Tom DiCillo e narrado pelo actor Johnny Depp (também ele fã de Morrison), este notável documentário revela momentos únicos do percurso atribulado dos The Doors, como concertos ao vivo, filmagens de arquivo, de bastidores e da vida mais íntima de cada elemento da banda, com especial enfoque no carismático líder, Jim Morrison, o "Rei Lagarto".
O documentário na versão integral:

terça-feira, 3 de julho de 2012

O poder da montagem

Quem viu o jogo da meia-final entre a selecção da Alemanha e a da Itália no Euro 2012, certamente terá reparado numa imagem em que se vê uma adepta alemã (na fotografia) a chorar na sequência do segundo golo da Itália. Certo? Errado.
Soube-se agora que a mulher que surgia a chorar não o estava a fazer por causa da derrota, mas sim por resposta emocional ao momento em que o hino alemão soava no estádio. Pelo menos é o que garante a própria mulher que, regressada a casa após ter assistido ao jogo, se deparou com esta manipulação da sua imagem pela televisão polaca.
Basicamente, o que a realização televisiva da UEFA fez foi ter gravado a imagem da mulher com a lágrima durante o hino, para depois colocar a mesma imagem logo a seguir ao segundo golo de Mario Bolatelli que eliminaria a Alemanha. Chama-se a isto manipulação emocional através de um recurso básico de montagem. 
O princípio teórico da montagem, estabelecido desde o período do cinema mudo, foi já muito estudado, sobretudo desde o famoso "Efeito Kuleshov" de 1929, no qual o realizador Kuleshov demonstrou o poder da montagem através de uma sucessão de imagens que, segundo a sua ordem, atribuíam significados contraditórios ao espectador (ver mais aqui). O realizador Sergei Eisenstein foi um eminente estudioso das potencialidades da montagem ao serviço da expressão estética das imagens, tão patente em filmes essenciais como "O Couraçado Potemkine" (1925) ou "Outubro" (1927). OU seja, a montagem pode atribuir significados diferentes às mesmas imagens dependendo da ordem em que estas forem... montadas.
Não sei se o realizador do jogo de futebol citado conhece estes filmes e a teoria por detrás do "Efeito Kuleshov", mas a verdade é que nem precisa. Ao manipular a imagem da mulher a chorar, o que fez foi confirmar a teoria dos russos: a de que a montagem consubstancia, porventura, a essência da linguagem cinematográfica e dos seus significados. Seja no cinema ou na televisão. 

segunda-feira, 2 de julho de 2012

O sonho de Gregory Peck


Que relações teve o excêntrico pintor Salvador Dalí com o cinema? De que forma a arte do cinema influenciou a sua pintura ou vice-versa? Sabe-se que houve um projecto abortado entre Walt Disney e Dalí para a realização conjunta de um filme de animação surrealista chamado "Destiny". Sabe-se da seminal colaboração entre Dalí e Luis Buñuel para a criação dos míticos filmes "Un Chien Andalou" (1928) e "La Edad de Oro" (1930), expoentes máximos do surrealismo no cinema.
Mas sabe-se também que Alfred Hitchcock encomendou a sequência do sonho a Salvador Dalí para o magnífico filme "Spellbound" (1945), no qual Gregory Peck "sonha" a sequência imaginada pelo pintor espanhol: