sábado, 30 de abril de 2011

Kubrick a preço de saldo

Já tinha vários livros sobre Stanley Kubrick mas faltava-me, na minha biblioteca sobre cinema, esta preciosa edição da Taschen: "Stanley Kubrick - A Filmografia Completa" em edição portuguesa.
Encontrei este livro à venda na livraria Bertrand por um preço muito simpático: 9,90€.
Um Kubrick a preço de saldo, portanto.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Vinil e imaginação

O Sleeveface, já por diversas vezes apresentado, é uma técnica que junta pessoas reais com capas de vinil, com resultados sempre surpreendentes. Esta é uma variante do Sleeveface, mas sem a componente humana. Ou seja, a composição é feita unicamente com capas de discos de vinil que se juntam de forma a criar uma imagem totalmente nova. E deve ser bem mais difícil e trabalhosa do que o Sleeveface convencional.










Discos que mudam uma vida - 140


Tosca - "Opera" (1997)

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Os gostos de Andrea


Confesso que nunca tinha ouvido falar da actriz Andrea Riseborough. Tem entrado em filmes de pouca relevância, mas é tida como um valor seguro para o futuro (o seu papel mais reconhecido foi a interpretação de uma jovem Margaret Thatcher num telefilme inglês).

Mas o que mais me chamou a atenção na leitura da nota biográfica desta actriz é que teve uma formação cultural atípica: actualmente com 29 anos, Andrea tinha nove anos de idade quando começou a ler Shakespeare, Chekov e Graham Greene. Quis ser escritora e na adolescência gostava de filmes a preto e branco antigos e de países do leste europeu. E aos 15 anos apaixonou-se pelos filmes de Andrei Tarkovski.

Ou seja, motivos mais do que suficientes para ter esta Andrea Riseborough em muito boa conta e consideração.

O labirinto de Jack Torrance


Uma vez por semana, João Palhares, autor do blogue "Cine Resort", convida bloggers a escolher um plano especial de um determinado filme e a falar, também, sobre ele. Esta semana o escolhido fui eu. Escolhi o último plano da sequência do labirinto da obra-prima "The Shining", de Stanley Kubrick.
_____

A justificação:

Kubrick sempre foi um esteta das imagens, um observador geométrico dos enquadramentos e dos planos minuciosamente estudados.

Em "The Shining" estas qualidades são particularmente evidentes. Não é tanto pelo virtuosismo da realização e da montagem, é também pela forma como Kubrick encena determinadas cenas, desafiando a toda a hora o olhar do espectador. O plano do labirinto é sintomático: Jack Torrance (Jack Nicholson) aproxima-se de uma maqueta do labirinto em cima de uma mesa situada no grande salão do Overlook Hotel. De repente, no plano seguinte, o espectador "vê" o labirinto pensando que se trata do mesmo que Jack está a olhar. Nada mais errado. O que o espectador vê é um plano fixo aéreo desse labirinto. Paulatinamente, a câmara vai-se aproximando (zoom in) até que damos conta que, bem no meio do labirinto, estão Danny e a mãe em movimento. Já não era o labirinto artifical da maqueta. Era o labirinto "real" onde estavam os dois personagens. Este plano é um prodigioso momento de cinema, de insuperável criatividade na construção da ilusão deste plano e, por inerência, do cinema em si mesmo.
Ver a sequência em vídeo.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Entrevista Póstuma (5) - Buster Keaton



O Homem Que Sabia Demasiado - É célebre a sua expressão "Tragedy is a close-up; comedy, a long shot". O que queria dizer com isto?

Buster Keaton - A tragédia e a comédia são dois campos que se tocam, o reverso da mesma moeda. Experimentar ambas só enriquece o ser humano e o torna mais sensível, mais compreensivo para com as contradições da própria vida. O filme "The General" é prova disso: com um tema sério, a guerra, eu construi uma comédia mordaz. Até na violência e na hostilidade se podem criar momentos de humor. O importante é saber equilibrar o lado da tragédia e o da comédia.

O Homem Que Sabia Demasiado - Nos seus filmes sempre houve essa espécie de "sentimento trágico da vida", apesar de toda a enorme carga de humor que era evidente.

Buster Keaton - Sempre foi esse factor que me diferenciou de Charles Chaplin. Ele tinha um lado sentimental da comédia, eu tinha um lado quase negro, quase trágico. Sempre entendi e usei o "gag" cómico como uma ferramenta de interpretação do mundo, das relações entre homens e mulheres, etc.

O Homem Que Sabia Demasiado - Cultivou um semblante sempre impassível, incapaz de expressar emoções, de feições neutras. Porquê?

Buster Keaton - Por um lado, foi uma forma de construir uma personagem icónica, capaz de resistir impávido à cena mais irresistivelmente cómica. Por outro lado, o facto de nunca rir, permitiu que o espectador pudesse projectar em mim as suas próprias emoções segundo o que via.

O Homem Que Sabia Demasiado - O seu humor era muito físico e consta-se que nunca recorreu a duplos nas cenas mais arriscadas.

Buster Keaton - É verdade. Sempre assumi os riscos da profissão que escolhi. Cresci no mundo do "vaudeville", que misturava circo, teatro, com muitos números cómicos arriscados. Aprendi a moldar e a controlar o meu corpo para quedas e saltos mais mirabolantes. Mas houve uma vez que andei com o pescoço partido durante um ano sem quase me dar conta...

O Homem Que Sabia Demasiado - O seu período de ouro foi durante a década de 20, em que realizou e interpretou várias obras-primas do cinema. A partir de 1930, com o contrato que fez com o estúdio Metro, entrou claramente em decadência.

Buster Keaton - É verdade, infelizmente. Nem foi por causa da ascenção do sonoro. Foi porque a partir desse momento perdi totalmente o controlo artístico dos filmes, e fui forçado a fazer filmes com argumentos e montagens impostos pelo estúdio.

O Homem Que Sabia Demasiado - Em 1952 entrou no filme "Luzes da Ribalta" de Chaplin. Como foi esse encontro?

Buster Keaton - Um momento único de dois artistas que fizeram carreira quase em simultâneo. ao contrário do que se dizia, nunca fomos adversários ou concorrentes no cinema. Cada um tinha o seu espaço, a sua arte, o seu espaço. Nesse filme interpretámos dois palhaços decadentes que faziam números em conjunto. Um filme melancólico que serviu quase como uma metáfora para as nossas carreiras naqueles anos.

A série Díptico

Para os leitores mais novos deste blogue: a série Díptico juntou 83 exemplares até Setembro de 2010. Uma série que estabeleceu pontos de contacto entre duas imagens. Aqui.

"Nevermind" - Nirvana

"Nevermind" - Bart Simpson

terça-feira, 26 de abril de 2011

Clássicos do Cinema em BD para Pessoas com Pressa #19

Clicar na imagem para aumentar.

Playtime #54


A solução: "Parade" (1974) - Jacques Tati
Quem descobriu: Álvaro Martins

Três revistas de cinema

Não há fome que não dê em fartura: depois de longos anos sem revistas de cinema, há alguns anos chegou a revista Premiere que tem aguentado até hoje. Pelo meio surgiram outros títulos que acabaram por desaparecerem à mesma velocidade que surgiram. A Premiere perdeu, quanto a mim, muito desde que foi reestruturada há cerca de um ano atrás.

Quando se punha em causa a viabilidade comercial da Premiere, dado o cenário da crise e da falta de leitores, o público português foi agora confrontado - não com mais um título, mas sim mais dois projectos editoriais inteiramente vocacionados para o cinema: Empire e Total Film, ambas revistas com larga implantação no estrangeiro e suportadas por fortes grupos económicos internacionais.

A Premiere conheço-a bem e por diversas vezes já a comentei no blogue. Há dias li a Empire e Total Film e a verdade é que são edições muito semelhantes: têm um "target" específico e assumido (espectadores que frequentam as salas de cinema comercial dos shoppings que querem notícias rápidas sobre a actualidade cinematográfica) e a linha editorial não foge, genericamente, dos pressupostos habituais: análise de estreias mensais, entrevistas a actores e realizadores, curiosidades das filmagens, reportagens de bastidores, radiografias mais ou menos exaustivas a filmografias de artistas famosos, etc. Basicamente, ambas as revistas se dedicam a publicar artigos traduzidos das congéneres estrangeiras, com algumas exepcções adaptadas ao mercado nacional.


Nestes dois produtos não existe crítica no sentido estrito e rigoroso (tirando a Premiere, não há colunistas credenciados que escrevem textos de forma mais aprofundada). O conteúdo editorial é meramente vocacionado para a divulgação e informação relativa ao mundo do cinema. E nem a reportagem (interessante, por acaso) da Empire sobre o Apocalypse Now de Coppola disfarça a prioridade claramente comercial da revista. Estas revistas configuram um formato jornalístico legítimo e necessário, mas o que duvido é que o nosso escasso mercado consiga, a médio prazo, assegurar a sobrevivência dos três títulos em questão.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

27

(A propósito dos recentes posts sobre suicídio e 'entrevista póstuma' a Jimi Hendrix):
É um fenómeno recorrente os ícones da cultura popular serem imortalizados quando morrem. Mesmo que sejam famosos e talentosos em vida, se morrerem jovens e, sobretudo, de causa trágica e misteriosa (suicídio, acidente, homicídio), é certo e sabido que se tornam ícones eternos no imaginário popular.
O fenómeno só podia ter começado com uma arte de massas: o cinema. Rudolfo Valentino, primeiro ídolo do cinema mudo morreu aos 31 anos em 1926 e deixou em total histeria milhões de admiradoras (conta-se que várias mulheres cometeram suicídio devido ao desespero). Depois, foi James Dean que morreu vítima de um acidente de carro com 24 precoces anos, em 1955, imortalizando a sua figura como referência incontornável da cultura do século XX. De resto, foi com Dean que se incutiu no imaginário das estrelas pop a máxima : "live fast, die young and leave a good-looking corpse". Muitos levaram à risca esta filosofia de vida.

Mas seria a partir de 1969 que a morte de artistas famosos - nomeadamente músicos - tomaria um rumo verdadeiramente iconográfico. Começou em 1960 com a morte de Brian Jones (Rolling Stones), seguiu-se a morte de Jimi Hendrix e Janis Joplin em 1970. O líder carismático dos The Doors, Jim Morrison, morreria em circunstâncias misteriosas um ano depois. Este quarteto de mortes foi apelidado de "Clube 27", pelo facto de todas estas figuras da música terem morrido com a idade de 27 anos. Mera coincidência?
Conta-se que foi um desejo mórbido de se juntar a este clube que o líder dos Nirvana, Kurt Cobain, se matou em 1994, também com 27 anos. Que insondável e misterioso desígnio se esconde por detrás deste fenómeno que leva à morte artistas populares como estes aos 27 anos? Apesar deste ser o quinteto mais famoso do fatídico e mórbido clube, muitos outros artista/músicos se podiam incluir no rol dos falecidos com 27 anos (por suicídio ou acidente). A saber:

- Pete de Freitas, guitarrista dos Echo and The Bunnymen

- Robert Johnson, guitarrista de blues

- Dave Alexander, baixista dos The Stooges

- Gary Thain, baixista dos Uriah Heep

- Kristen Pfaff, baixista das Hole

- Jeremy Michael Ward, músico dos The Mars Volta

- Mia Zapata, vocalista do grupo punk The Gits

- Ron McKernan, teclista dos Grateful Dead

- D. Boon, vocalsita do grupo punk Minutemen

- Rupert Brooke, poeta inglês

- Jean-Michel Basquiat, artista plástico

- Jonathan Gregory Brandis, actor americano

- (...)


Ian Curtis não quis esperar para entrar no "Clube 27" e, 4 anos antes de chegar a essa idade, cometeu suicídio. Mesmo não havendo nenhum "Clube 23" no qual pudesse estar representado, não é por este facto que o espírito do cantor dos Joy Division não vive no panteão mais alto dos ícones musicais de toda a história.

sábado, 23 de abril de 2011

Genealogia de Fotogramas #5








A televisão pascal


Se um dia Portugal for, verdadeiramente, um Estado laico, se um dia houver suficiente coragem dos programadores televisivos, chegará uma Páscoa em que as televisões programarão filmes como "A Última Tentação de Cristo" de Martin Scorsese, "A Vida de Brian" (na imagem) dos Monty Python ou "O Evangelho Sergundo São Mateus" de Pasolini, em vez dos épicos pastelões dramáticos à volta da versão "oficial" da vida de Jesus Cristo.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

"48" - Os rostos que falam


Tive a sorte de ver o filme "48" em Outubro de 2010, num encontro cinematográfico no Teatro Municipal da Guarda. Dos vários filmes exibidos, este documentário de Susana de Sousa Dias, foi o que me causou mais espanto: pela inovação estética, pelas opções de realização, pela austeridade formal e pelo lado comunicacional fortemente eficiente.
Baseado nas fotografias de arquivo que a PIDE tirou dos prisioneiros políticos durante o regime fascista de Salazar, "48" explora os rostos desses prisioneiros antes e depois da experiência prisional (que quase sempre era acompanhada por terríveis suplícios de tortura e opressão).

Ao mesmo tempo que o espectador vê, em imaculados planos fixos, os rostos de desespero e angústia, ouve o testemunho das terríveis experiências passadas pelos presos. São rostos que interpelam, incomodam, questionam a própria substância e valor de uma imagem. A montagem, minimalista e quase ascética, abdica da tradicional estratégia narrativa, optando por estruturar o filme como uma sequência rígida de fotografias (separadas por suaves "fade-out" durante 90 minutos). A sonoplastia é subtil mas suficiente para aumentar o ambiente austero e emocional das imagens e respectivos relatos. Os silêncios incómodos também abundam nos depoimentos angustiados das vítimas (chega-se a ouvir a respiração dos homens e mulheres).

São testemunhos pungentes de homens e mulheres vulgares que sofreram nas mãos de carrascos a mando de um sistema mais violento do que se julga. São rostos que falam, que expressam variadas emoções e provam a violência psicológica exercida pela polícia política de Salazar. O filme "48" é, por isso, um documento fascinante sobre a ditadura e uma experiência audiovisual única, exigente, original, com um grande significado histórico e que contém uma força interior serena que chega a perturbar (não admira que tenha conseguido variadíssimos prémios pelos festivais por onde tem passado).
"48" estreou esta semana e é o grande destaque do Ípsilon desta semana.

O cinema de terror


"Podia dizer que o cinema de terror me interessa porque joga com as emoções primitivas como o medo, porque usa as técnicas todas de manipulação do espectador, porque reclama abertamente o conceito de eficácia, porque exorciza traumas epocais, porque interroga o universo moral e o primado do visível.

Mas também podia dizer que o cinema de terror me interessa porque tem raparigas de 21 anos com calções e top a correr de um lado para o outro".

Pedro Mexia, in "Estado Civil - Diário de Uma Crise" (2009)

Discos que mudam uma vida - 139


Mão Morta - "Mão Morta" (1988)

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Um pequeno (grande) filme




Por vezes somos surpreendidos com filmes como este "The Sunset Limited" (2011). Filmes que não têm quaisquer pretensões comerciais, de concepção totalmente minimalista e com dois trunfos inestimáveis: um magnífico argumento e dois actores em estado de graça - Tommy Lee Jones e Samuel L. Jackson.

"The Sunset Limited" é a adaptação de um livro de um grande escritor americano, Cormac McCarthy - o mesmo que escreveu "The Road", adaptado em 2009 pelo realizador John Hillcoat.

O filme é um projecto pessoal do actor Tommy Lee Jones (que assumiu também a realização) para o canal de televisão HBO, e contou com o apoio e argumento adaptado do próprio escritor. Durante uma hora e meia, o filme passa-se integralmente no espaço da sala de estar da cada de um dos personagens e tudo gira à volta da discussão entre estes dois homens de quem nem se conhecem os respectivos nomes.

A personagem de Samuel L. Jackson salva, no último momento, Tommy Lee Jones do suicídio na estação de metro The Sunset Limited (Nova Iorque). Leva-o para o seu apartamento. E, em tempo real da acção, vemos o diálogo intenso e dramático (por vezes divertido) entre estes homens que representam duas visões antagónicas do mundo e da vida: um é ex-evangelista, crente em Deus e na esperança da vida; o outro é um desolado e pessimista ateu que deseja morrer em paz. Os diálogos, alheios a lugares-comuns, são de uma grande subtileza e profundidade sobre a morte, o sentido da vida, o papel da religião, os valores morais da sociedade, o direito ao suicídio.

Um filme que explora magistralmente as contradições da natureza humana, as suas aspirações e desilusões, de uma forma absolutamente exemplar. Para tal muito contribui o argumento acutilante e inteligente de Cormac McCarthy e o desempenho fascinante de Samuel L. Jackson e Tommy Lee Jones. É um filme que não teve - e dificilmente terá brevemente - estreia nas salas portuguesas (foi concebido para a televisão americana). Um filme discreto e minimalista, mas infinitamente superior a 90% dos filmes que estreiam semanalmente em Portugal. Altamente aconselhável.