domingo, 29 de agosto de 2010

A música de "The Ghost Writer"

Finalmente vi "The Ghost Writer" ("O Escritor Fantasma") de Roman Polanski. Mas hoje não me apetece falar do filme (um thriller competente sem deslumbrar). Apetece-me antes falar da música do filme. Finalmente vi uma película, nos últimos tempos, com uma excelente banda sonora. O compositor é francês - Alexandre Desplat - e já tinha dado mostras do seu talento em filmes como "The Curious Case of Benjamim Button", "The Queen" ou "Girl With a Pearl Earring" (foi nomeado ao Óscar por estes dois últimos títulos).
Em "The Ghost Writer", Alexandre Desplat compôs uma banda sonora que evoca o melhor da tradição dos thrillers clássicos de Hollywood, indo buscar inspiração a Bernard Herrmann, John Barry, George Delerue ou até Danny Elfman.
Polanski sempre atribuiu grande importância à música nos seus filmes, e esta constatação é patente desde os seus primeiros thrillers psicológicos dos anos 60. "The Ghost Writer" não é excepção e a música de Desplat motiva o crescendo de tensão com trechos musicais cirúrgicos que intensificam e dão significado a cada cena e a cada ambiente.
Uma música que não se sobrepõe à acção (pelo contrário, por vezes é tão ténue que quase não se dá por ela), uma música que inspira inquietude, deslumbre e imaginação.

Tati animado por Chomet

Estreia só no dia 25 de Novembro em Portugal, mas é já um dos filmes que mais anseio ver: "O Ilusionista" do realizador francês Sylvain Chomet (autor do sublime "Belleville Rendez-Vous").
Baseado num argumento original de Jacques Tati, este filme de animação relata a história de um ilusionista que tenta singrar em bares da uma comunidade rural da Escócia dos anos 50. O personagem do ilusionista é encarnado, em jeito de homenagem, pela figura física do próprio Jacques Tati.

Livros à distância de um clique


Quase dois mil livros (e outras tantas obras) para descarregar, gratuitamente, em formato PDF: Fernando Pessoa, Shakespeare, Oscar Wilde, Eça de Queiroz, Rimbaud, Thomas Mann, Cervantes, James Joyce, Kafka, Machado de Assis, entre muitos outros escritores de renome nacional e mundial. É só fazer clique.

sábado, 28 de agosto de 2010

Perguntas indiscretas - 35

É impressão minha ou Akira Kurosawa, apesar da sua inegável qualidade artística e importância histórica, é um dos realizadores mais esquecidos e menos citados de sempre?

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Tarkovski e Dostoievski em trabalho académico

Este senhor da imagem chama-se Daniel Robledo Muñoz. É um professor espanhol de Filosofia e de Ciências da Comunicação da Universidade Complutense de Madrid e defendeu, há pouco tempo, uma tese de doutoramento sobre o realizador russo Andrei Tarkovski.
A tese intitula-se "A Santa Rússia em Andrei Tarkovski" e explora a relação entre o cineasta e o escritor Dostoievski (um autor caro a Tarkovski). A tese académica obteve a classificação máxima por unanimidade e o seu autor aguarda agora que uma editora interessada publique em livro o seu trabalho. Esperemos que assim seja.
Este tema tem relação com o trabalho académico sobre o realizador espanhol Luis Buñuel.

O final épico de Corleone

Apesar da sofrível interpretação de Sofia Coppola, este é um dos melhores finais de filme dos últimos 20 anos. Épico, mesmo. Refiro-me à sequência final do filme “O Padrinho 3” da saga “O Padrinho” de Francis Ford Coppola. É um final espantoso de energia e emoção.
Al Pacino ao seu melhor nível – o grito surdo (mas ensurdecedor) na escadaria após a morte da filha é arrebatador. Memorável para sempre é a sequência seguinte: a montagem seguinte com o momentos passados de felicidade (a dança com as três mulheres da sua vida), a belíssima banda sonora e, apogeu dos apogeus, o rosto de Michael Corleone decadente, velho e sozinho.
O movimento lento e agonizante de colocar os óculos. E o plano final, com o mesmo Corleone sentado, um cão vagabundo a rodeá-lo, a morte inadiável e totalmente solitária. O fim triste da família Corleone. Emocionante até às lágrimas, num filme que, quanto a mim, não desmerece em relação às obras-primas anteriores da trilogia. Pura arte.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Discos que mudam uma vida - 116


Laurie Anderson - "Big Science" (1982)

O ponto alto do dia


Voz-off de de Lester (Kevin Spacey) no iníco do filme "Beleza Americana" (1999) de Sam Mendes: "O ponto alto do meu dia é de manhã quando me masturbo no duche. A partir daí é sempre a descer..."

A magia sonora do didjeridoo


O didjeridoo é um instrumento de sopro oriundo das tribos aborígenes australianas. Tradicionalmente, é um tronco longo de eucalipto ou de bambu oco por acção das térmitas. Tem um som característico e pode variar entre a austeridade tímbrica e a suavidade mística. O didjeridoo está longe de se restringir à música étnica, uma vez que tem sido utilizado (e continua a ser) em muitos grupos de música e géneros musicais ocidentais.
Aliás, é um instrumento tão popular como o djambé. Apesar de não parecer, tocar didjeridoo não é fácil e requer treino persistente, sobretudo para o músico conseguir controlar a chamada técnica de "respiração circular", que permite emitir sons de forma contínua: expira-se com a boca e inspira-se pelo nariz ao mesmo tempo (tenho um didjeridoo e só consigo produzir uns escassos e titubeantes sons...).
Em Portugal há um excelente executante deste instrumento australiano: faz parte do grupo Olivetree, um trio de músicos constituído por um tocador de didjeridoo, um baterista e um percussionista. Os seus concertos ao vivo (vi-os uma vez) são uma verdadeira e alucinada celebração rítmica (como se fosse drum'n'bass tribal). Por esse mundo fora há muitos músicos que tocam didjeridoo, de forma amadora ou profissional. Um dos maiores especialistas no didjeridoo é Stephen Kent, um músico australiano que fez parte do grupo Trance Mission. No vídeo que se segue podemos vê-lo a tocar com o baterista americano Tony Royster jr., um jovem e talentoso músico de 23 anos (começou aos 10!).
A junção dos sons graves e ondulantes do didjeridoo com os ritmos da percussão conferem uma proposta musical deveras inusitada e contagiante.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

"The Shining" - versão comédia familiar

No mundo da tecnologia onde todas as possibilidades virtuais são possíveis, eis que, à semelhança do inquietante filme "Eraserhead" de David Lynch, também o clássico de terror "The Shining" de Stanley Kubrick pode ser transformado numa simples comédia para o público familiar.
Para conseguir esse desconcertante efeito, basta recorrer a uma minuciosa e sugestiva montagem dos planos, a uma voz off adequada e a uma banda sonora apropriada às imagens; quem não conhecer o filme será levado a pensar que se trata mesmo de uma comédia insípida ideal para ver na televisão, descontraidamente com a família, num domingo à tarde.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

O romantismo impossível


Lauren Bacall e Robert Pattinson
James Dean e Eva Mendes

Megan Fox e Gary Cooper

Scarlett Johansson e Burt Lancaster
George Clooney e Grace Kelly

Clark Gable e Madonna

Leonardo DiCaprio e Carmen Miranda
Claudia Schiffer e Peter Sellers
Clark Gable e Natalie Portman
Buster Keaton e Tara Reid

O bailado de Satie, Cocteau e Picasso


Em 1917, Jean Cocteau, propôs a Serguei Diaguilev, empresário dos famosos Ballets Russes, colaborar com o compositor Erik Satie num ballet muito especial. Desta conjugação artística surgiu o bailado "Parade" (na imagem), com argumento de Cocteau e ainda cenários e figurinos do pintor Pablo Picasso.
A partitura musical de Satie, pianista e compositor visionário, continha sons de máquinas de escrever, apitos de sereias, ruídos de hélices de avião, de aparelhos de Morse, e de roletas de lotaria (a ideia era assaz original, mas não totalmente inovadora: o futurista italiano Luigi Russolo tinha construído "máquinas para fazer ruído" três anos antes). O lugar exigido a todos estes objectos exigiu uma redução de instrumentos musicais convencionais no fosso de orquestra, opção que provocou uma acesa discussão no seio da crítica e dos espectadores.
"Parade" foi um ballet inovador e ousado em termos estéticos (nos cenários, na coreografia e na música, um pouco à semelhança de "A Sagração da Primavera" de Stravinski), antecipando uns anos o movimento surrealista. Os críticos arrasaram sobretudo a música.
Erik Satie, com a sua personalidade irreverente e incontida, não se ficou e escreveu, satiricamente, um texto com o título "Elogio dos Críticos", que começa assim: "O ano passado fiz várias conferências sobre a inteligência e a musicalidade nos animais. Hoje vou falar-vos da inteligência e da musicalidade nos críticos. O tema é quase o mesmo, portanto."

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Internet: fonte para filmes


À falta de ideias mais originais, Hollywood parece agora virar-se para projectos cinematográficos que explorem ferramentas de sucesso da Internet.
O recente "The Social Network" de David Fincher aborda a criação do Facebook. Já era de esperar que a Google também quisesse um filme sobre os seus dois fundadores - Sergey Brin e Larry Page. E é o que vai acontecer brevemente: a história da criação do maior motor de pesquisa do mundo vai ser levada ao grande ecrã.
Agora, por uma questão de elementar justiça, espera-se que surjam no futuro filmes sobre a história do YouTube, Wikipédia, Twitter, Myspace, MSN, Yahoo, Blogger, Imdb, Hi5, Lastfm, Flickr e, porque não, o símbolo da arrob@.
Daria uma boa quantidade de filmes para os próximos anos...

Um livro sobre músicas do mundo


António Pires, jornalista, escritor, DJ e autor do notável blogue "Raízes e Antenas", apresentou no Festival de Músicas do Mundo de Sines, no dia 31 de Julho, o seu livro "Raízes e Antenas - Mistérios e Maravilhas da World Music", que será lançado no mercado nacional em princípios de Setembro.
Editado pela MediaXXI, "Raízes e Antenas" reune 200 artigos sobre música do mundo que António Pires publicou no seu blogue durante alguns anos. Segundo a nota à imprensa, esta obra abrange géneros musicais locais ou regionais de inúmeros países, viajando por todos os continentes e dando igual importância às músicas de raiz e às fusões entre vários estilos, este livro serve sobretudo como uma introdução a estas inúmeras músicas do mundo e a alguns dos seus artistas e grupos mais representativos.
Dado que é rara a edição de obras de autores portugueses sobre world music no mercado nacional, sauda-se este livro de António Pires, jornalista que eu comecei a gostar de ler há 20 anos nas páginas do (então) semanário BLITZ (e não só) e, desde há uns anos, no seu blogue tão especial.
Estou muito curioso para ler este livro que poderá, certamente, ajudar na divulgação das sempre inebriantes e riquíssimas músicas étnicas do mundo.

E se Star Wars fosse um filme mudo?

Imaginem como seria "Star Wars" se tivesse sido realizado na mesma época do "Nosferatu" (1922) de F.W. Murnau. Ou seja, em pleno apogeu do cinema mudo.
Seria qualquer coisa como isto:

domingo, 22 de agosto de 2010

A Rapariga Que Sabia Demasiado


"The Girl Who Knew Too Much" é um filme do realizador italiano Mario Bava, datado de 1963, e narra a história de uma turista que testemunha uma série de terríveis assassínios...
Afinal, para além de James Stewart do filme "The Man Who Knew Too Much" (título que deu nome a este blogue), há também "raparigas que sabem demasiado"!

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O segredo das capas

De quem são os rostos e os corpos que surgem em famosas capas de disco? Alguns exemplos:

Artista: The Smiths
Álbum: "Strangeways, Here We Come" (1987)
Capa: O actor Richard Davalos, que contracenou com James Dean no clássico filme "A Leste do Paraíso" (1955).
Artista: U2
Álbum: "Boy" (1980)
Capa: o rapaz da capa é o irmão de um artista amigo de Bono, Peter Rowan (actualmente um artista de renome). A imagem do rapaz foi retirada no mercado americano devido a receios de acusações de pedofilia.

Artista: The Smiths
Álbum: "The Smiths" (1984)
Capa: Morrissey criou o grafismo da capa do disco de estreia dos Smiths, tendo como base um fotograma do filme "Flesh" de Andy Warhol com o actor Joe Dallesandro.

Artista: Roxy Music
Álbum: "Country Life" (1974)
Capa: Bryan Ferry conheceu as modelos Constanze Karoli e Eveline Grunwald em Portugal e convenceu-as a posar para a memorável (e posteriormente censurada) capa dos Roxy Music.

Artista: Radiohead
Álbum: "The Bends" (1995)
Capa: O artista Stanley Downood criou uma imagem de fusão entre o rosto de Thom Yorke e um "medical dummy".

Artista: Pixies
Álbum: "Surfer Rosa" (1988)
Capa: uma amiga de amigos dos músicos posou em topless em pose de bailarina de flamenco. A fotografia é da autoria de Simon Larbalestier, responsável pela maior parte do "artwork" da banda.

Artista: Pantera
Álbum: "Vulgar Display Of Power" (1992)
Capa: o homem que leva o murro é anónimo mas sabe-se que recebeu dinheiro para a sessão fotográfica que resultaria na capa dos Pantera. Consta-se que levou trinta murros até conseguir a imagem perfeita (da capa).

Artista: Black Grape (Shaun Ryder)
Álbum: "It's Great When You're Straight… Yeah" (1995).
Capa: o rosto da capa é a do terrorista Carlos, o Chacal, pintado num estilo "pop art"

Artista: "The Rolling Stones
Álbum: "Sticky Fingers" (1971)
Capa: o actor fetiche de Andy Warhol, Joe Dallesando, posou para a capa do disco.

Artista: Rage Against The Machine"
Álbum: "Rage Against The Machine" (1992)
Capa: Thích Quung Dúc, monge budista vietnamita que se auto-imolou pelo fogo em Saigão (1963) em protesto pela opressão exercida sobre os monges.

"Grizzly Into The Wild Man"



O que têm em comum os filmes "Grizzly Man" (2005) de Werner Herzog e "Into The Wild" (2007) de Sean Penn? Numa primeira análise, pouco, na verdade. Mas nesse pouco, parece-me a mim, é capaz de caber uma vida inteira. Quase arriscaria dizer que os títulos destes dois filmes poderiam ser trocados que não se notaria grande diferença.
O "Grizzly Man" vive "Into The Wild" e o personagem deste filme sente, basicamente, as mesmas pulsões do defensor dos ursos. No fundo, os protagonistas destes dois filmes renunciam às comodidades da civilização para explorarem outro rumo às suas vidas. Cada um à procura da sua própria felicidade.
Ambos questionam o lugar do homem no seio da civilização em confronto com a natureza, tentando compreendê-la, frui-la, senti-la. De dois modos muito distintos, é certo, mas com desfechos dramáticos muito semelhantes. Em suma, a vida humana à procura de um verdadeiro sentido no contacto com a natureza primordial e selvagem.

Cinecitta - Souvenirs cinéfilos

Para os indefectíveis da cultura pop em geral e do cinema em particular, nada melhor do que consultar a loja (em Lisboa) Cinecitta. Aqui vendem-se DVD de importação (filmes raros ou de culto), dezenas de t-shirts de filmes e de realizadores, bonecos, posters, postais e uma infinidade de objectos alusivos à 7ª arte. Vale a pena espreitar.
Da minha parte, vou encomendar esta t-shirt:

Tamanho S.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Filmes triangulares

Clicar na imagem para aumentar.

O cinema e a publicidade


No filme "Estranha em Mim" (2007), de Neil Jordan (na imagem), com uma Jodie Foster que pratica a justiça pelas próprias mãos, há uma cena numa carruagem de metro na qual dois jovens negros, manifestamente delinquentes, acossam um jovem que está a ouvir música num iPod. Perguntam:
- "Meu, que estás a ouvir?!"
- "Radiohead".
- "Radio... quê?"
- "Radiohead!"
- "Não interessa, passa para cá o iPod!"

Já não sei que filme vi o outro dia cujo adolescente ostentava uma t-shirt dos The Strokes. No "Exterminador Implacável 2", o actor Edward Furlong envergava uma t-shirt dos Public Enemy. Estas opções não são inocentes nem casuais. Muitos outros exemplos existem. Na linguagem da publicidade e do marketing, chama-se a isto "product placement", ou seja, uma estratégia subtil mas intencional de colocar produtos comerciais reais (marcas de todo o tipo) em filmes, videoclips, conferências de imprensa, etc. O filme "O Náufrago" (ver post mais abaixo), surgiam constantemente referências directas à companhia de distribuição FedEx e a outras marcas de consumo.
Quando se vê um personagem de um dado filme beber 7Up ou a comer chocolates M&Ms, a ouvir música numa determinada marca de aparelhagem de som, a lavar os dentes com uma dada marca de dentífrico, ou usar um cartão de crédito específico, estes produtos não estão lá por acaso. As marcas pagam, e muito, para que os seus produtos surjam nos filmes (nem que seja por breves segundos) como forma subliminar de incutir no espectador produtos comerciais.
A série James Bond regista um manancial infindável de "product placement" (publicidade a bebidas, relógios, passando pelos inevitáveis automóveis).
Pegando de novo no exemplo do filme "Estranha em Mim", constatamos que é um claro exemplo de nova estratégia de "music placement". O miúdo ouvia no seu iPod os Radiohead porque o contrato entre os produtores do filme e a editora do grupo (ou a respectiva agência promocional) assim o quiseram. O negócio e o lucro imperam nas escolhas. Simples.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

A reunião de três génios


Fotografia histórica: Buster Keaton, Jacques Tati e Harold Lloyd reunidos, em 1959, durante a cerimónia de entrega dos Óscares.
Foi nesse ano que Jacques Tati recebeu o Óscar do Melhor Filme Estrangeiro com a obra-prima "O Meu Tio". Três referências absolutas do melhor humor no cinema do século XX. E, para mais, no ano em que Jacques Tati, o mestre do cinema cómico que tanto admirava Keaton e Lloyd, ganhava o tal Óscar para Melhor Filme Estrangeiro (só faltou Chaplin na fotografia). Harold Lloyd foi sempre uma figura secundária face a Chaplin ou Keaton, mas foi um notável actor cómico do período mudo.
Esta imagem revela cumplicidades artística recíprocas e uma admiração partilhada, numa altura em que Keaton e Lloyd eram já figuras eclipsadas do firmamento cinematográfico, e Tati despontava para uma escassa mas fulgurante carreira que marcaria a 7ª Arte europeia durante décadas.

A magia do cinema de Chaplin


Há uns tempos a RTP2 transmitiu um conjunto de episódios da série "Chaplin Hoje" sobre o cinema do genial Charlie Chaplin. Vi apenas um episódio, sobre o filme "A Quimera do Ouro" ("The Gold Rush", 1925), com comentários do realizador do Burkina Faso Idrissa Ouedraogo.
Magistral série, magistral filme, magistral cineasta e actor.
Há uns anos comprei os DVD completos do Chaplin da editora Mk2 - e foi um prazer rever (ou ver pela primeira vez) as obras-primas do autor de "Tempos Modernos" e "Luzes da Cidade" em versões remasterizadas (som e imagem imaculados).
E apercebi-me que Chaplin foi (continua a ser) um dos maiores mestres de sempre do cinema mundial (não só do período mudo), capaz de encenar a poesia, o amor e a tragédia em imagens inesquecíveis - "O Garoto de Charlot", "Luzes da Cidade" -, mas também a sátira demolidora - "O Grande Ditador", "Tempos Modernos" - e engendrar obras únicas de humor - "O Circo" e dezenas de outras curtas-metragens.
Das muitas sequências memoráveis do cinema de Chaplin, há uma que jamais esqueci e que me arrepia sempre que a revejo: em "The Kid" (1921) o garoto (espantoso Jackie Coogan) de Charlot a ser levado pela polícia e o comovente reencontro com o pai adoptivo. Sem diálogos, sem palavras. Pura emoção em imagens.

No universo da comédia burlesca, admiro imenso a genialidade de Buster Keaton, mas Chaplin será sempre Chaplin.

Wilson


Wilson é um "personagem" determinante no filme "Cast Away" ("O Náufrago", 2001) de Robert Zemeckis (a história de um sobrevivente numa ilha deserta). E escrevo "personagem" entre parênteses porque se trata de um objecto inanimado.
Wilson é o nome do amigo imaginário criado pelo personagem Chuck Noland (Tom Hanks) como forma de combater a solidão extrema na ilha deserta durante 4 anos. Wilson era, simplesmente, uma bola de voleibol onde Chuck pintou um rosto (com o seu próprio sangue) com feições humanas.
Apesar de ser um objecto inerte, Wilson desempenhou um papel crucial no desenrolar do filme, porque todas as emoções de Chuck eram transmitidas para a bola - enquanto representação do elemento humano. Chuck sobreviveu e quase que morreu por causa de Wilson. Na tentativa de fugir da ilha, Chuck salvou-se do afogamento, tentando desesperadamente salvar o seu "companheiro", em vão.
Enquanto esteve sozinho na ilha, Chuck projectou na bola todas as suas frustrações, expectativas, desejos, raiva, medos, revolta. A bola "ouvia" os desabafos desesperados de Chuck; e este falava-lhe como se estivesse mesmo outra pessoa do outro lado. Wilson era apenas uma bola, mas para Chuck tornou-se um elemento vital para a sua sobrevivência, permitindo-lhe alcançar algum equilíbrio emocional e psicológico, uma verdadeira bóia (bola) de salvação.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

As frases de Kubrick


Stanley Kubrick foi um realizador que cultivou um estilo de vida quase eremita: durante toda a carreira pugnou por um acentuado ascetismo social e profissional. Praticamente não dava entrevistas a jornalistas, furtava-se às festas das estreias dos seus filmes, não mantinha relacionamentos duradouros com outros realizadores ou actores, nem nunca escreveu um livro de memórias (como fizeram Bergman, Bresson, Buñuel ou Tarkovski).
Porém, conhecemos minimamente algumas das suas opiniões através de afirmações que se podem encontrar dispersas na internet ou em livros de cinema.
São frases ditas pelo génio de "A Laranja Mecânica" que revelam a ponta do véu do seu espírito visionário e irrequieto:

- "A filmmaker has almost the same freedom as a novelist has when he buys himself some paper"
- "I never learned anything at all in school and didn't read a book for pleasure until I was 19 years old."
- "The great nations have always acted like gangsters, and the small nations like prostitutes."
- "A film is - or should be - more like music than like fiction. It should be a progression of moods and feelings. The theme, what's behind the emotion, the meaning, all that comes later."
- "There are few things more fundamentally encouraging and stimulating than seeing someone else die."
- "Perhaps it sounds ridiculous, but the best thing that young filmmakers should do is to get hold of a camera and some film and make a movie of any kind at all."
- "If it can be written, or thought, it can be filmed. "
- "The screen is a magic medium. It has such power that it can retain interest as it conveys emotions and moods that no other art form can hope to tackle. "

Discos que mudam uma vida - 115


The Cramps - "Bad Music for Bad People" (1984)

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Falar dos livros sem os ler?

E que tal falar de livros sem… os ler? Hoje já é tudo possível.
E é também possível fazer figura de intelectual falando à mesa do café sobre livros e autores que estão na berra mas que nunca lemos ou, no limite, lemos duas ou três passagens. Este livro, “Como Falar de Livros Que Não Lemos?”, pretende isso mesmo: partindo de uma análise a diversas obras literárias, o autor elabora uma síntese com os tópicos essenciais, parar que o leitor fique com uma noção básica sobre o conteúdo e a forma dessas obras e assim poder fazer um brilharete junto dos amigos e de intelectuais encartados.
Fogo-fátuo e mundo de aparências, portanto.
O autor do livro, Pierre Bayard, afirma que este manual serve como incentivo à leitura, numa nova modalidade de ler um livro. Apesar de não o ter lido (folheei-o numa livraria), parece-me antes um desincentivo ao exercício da leitura e do culto pelos livros ao potenciar o facilitismo e a superficialidade. É um livro presunçoso e pueril, como que a dizer: “não leia na íntegra ‘Os Maias’, leia o meu resumo e é como se o tivesse lido”.
Este livro é o reflexo da sociedade massificada que vive a grande velocidade e que não privilegia o verdadeiro investimento cultural. Não valerá mais a pena ler somente meia dúzia de páginas de grandes escritores do que ler as respectivas sinopses técnicas de Bayard? Não será mais enriquecedor?
Num mercado editorial mimético como o nosso, é mais do que expectável que vejamos brevemente adaptações deste livro conforme as áreas artísticas: “Como Falar dos Filmes Que Não Vimos?”, “Como Falar dos Discos Que Não Ouvimos?” Ou, por absurdo, "Como Falar de Perfumes Sem os Ter Cheirado?".