segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Madonna - o ponto de não retorno



João Lopes e Nuno Galopim são dois jornalistas pelos quais tenho o maior respeito. Lopes é um veterano crítico de cinema da imprensa portuguesa que me habituei a ler durante anos e Galopim um crítico de música (menos veterano que Lopes) que marcou uma época no Diário de Notícias. Ambos têm um blogue bem referenciado na blogosfera portuguesa - sound + vision. Um espaço que reflecte - como só João Lopes sabe fazer - uma vez que é o principal redactor do blogue - as tendências e novidades da cultura pop contemporânea. Ora, para quem acompanha regularmente o blogue do João Lopes e do Nuno Galopim, sabe que os dois são fãs de Madonna. Sobretudo o João Lopes, que tem dissertando abundantemente sobre as transfigurações de imagem da dita rainha da pop e da sua projecção no contexto da evolução da música pop dos últimos 20 anos. O crítico de cinema tem publicado largas dezenas de posts sobre a Madonna no sound+vision, assinalando os 50 anos da cantora de "Like a Virgin".
Nada contra o facto de João Lopes, jornalista que considero de grande craveira intelectual e sólida formação cultural, seja fã irredutível de uma artista pela qual não nutro a mínima admiração (não chego aos pés de uma certa virulência do blogger Marco Santos!). Isto para dizer que me espantou ler o seu texto de análise sobre o concerto no Parque da Bela Vista. E logo
no conteúdo da primeira frase, quando diz: "Ao todo fomos 75 mil no Parque da Bela Vista. Ninguém deverá ter saído desiludido... Mas ficou a sensação de termos assistido ao final de uma etapa." Parece-me que a admiração cega de Lopes por Madonna lhe toldou o discernimento. Explico: quem garante ao João Lopes que todas as 75 mil pessoas que assistiram ao concerto não saíram desiludidas? É que todas as referências que li hoje na net (fóruns de música, blogues, jornais...) sobre o balanço do mesmo apontavam para uma desilusão. Fosse opinião de espectador ou de crítico, como a opinião de João Gonçalves. Mais: num concerto que alguns nem conseguiam ver de binóculos, seria estranhíssimo que todas as 75 mil almas tivessem saído maravilhadas de um espectáculo que era mais do que previsível e cujas referências e investimento continuam a centrar-se mais na cenografia colossal, nas luzes, nos vídeos propagandísticos e nas coreografias vistosas, do que propriamente na música. A esse título, é bom reter a opinião da grande maioria de espectadores que saíam do parque da Bela
Vista e que foram entrevistados pelas várias televisões: o discurso elogioso acerca do espectáculo proferido pelos espectadores centrou-se sempre na grandiosidade do aparato visual e cénico e quase nunca na música. Ah, também foi mencionada a boa forma física da cantora...
Depois, dificilmente se conseguiria reunir a unanimidade crítica no conjunto de 75 mil espectadores. Curioso constatar que João Lopes acaba o seu texto, precisamente, a antever a necessidade de reinvenção do espectáculo da Madonna, ao asseverar: "As frequentes pausas para tocar guitarra não escondem a necessidade de “repouso” em cena. Nada de errado na opção. De resto, pode nascer nessa pose uma nova ideia de concerto para um futuro não muito distante. Em salas mais pequenas, sem aparato. Apenas as canções... Porque não?" Sim, porque não? Talvez porque com a anulação de todo o aparato visual Madonna não conseguiria seduzir tantas dezenas de milhar de pessoas nem gerar as receitas astronómicas que gere com a actual "Sticky and Sweet Tour". A minha opinião é que, por mais que Madonna quisesse, chegou a um tal elevado estatuto de estrela planetária que já não lhe permite, de todo, optar por uma solução de concerto mais intimista centralizado apenas nas canções. Seria defraudar os fãs. É a lógica do mercado e do espectáculo.
Afinal de contas, a máxima será sempre: "There's No Business Like Show Business".

7 comentários:

Zé Loff disse...

Concordo com a análise (também não sou fã, e também não percebo o hype) e isto na realidade não passa de um pormenor que não altera grandemente o conteúdo, mas o texto no sound+vision vem assinado pelo Nuno Galopim, não pelo João Lopes...

Rolando Almeida disse...

creio que a Madona é um caso muito mais interessante para discutir na sociologia ou psicologia de massas do que na musicologia, muito embora seja um produto directo da indústria musical popular. O trabalho da cantora nunca me interessou. Não conheço um só disco completo. Só conheço as músicas que é impossível não conhecer. Eu não sei explicar musicalmente o sucesso da cantora visto que não consigo gostar da sua música. Talvez seja explicável pelas leis da indústria...

Unknown disse...

Devo assumir o lapso cometido: efectivamente, não foi o João Lopes a assinar o texto mas sim o Nuno Galopim. O próprio me chamou a atenção para este erro.

Como costuma ser quase sempre o João Lopes a escrever sobre a Madonna no sound+vision, assumi instintivamente que tinha sido ele o autor desse texto. E nem me dei ao trabalho de conferir a assinatura.

Peço desculpa aos autores do blogue pela troca de nomes.
VA

Ana disse...

Eu também não sou nem nunca fui fã da Madonna e por isso não entendo lá muito bem como ela consegue ter tantos anos de carreira. Ela já admitiu que não tem uma grande voz e por isso usa outros meios para continuar a despertar interesse dos fãs, como a aposta nas coreografias meticulosamente estudadas e os efeitos visuais em palco.
Nenhum fã vai achar que ela canta maravilhosamente bem, então porque é que houve gente desiludida?
Quanto a um espetáculo mais intimo só com voz e guitarra até acho que seria uma boa ideia... mas ia ser demasiado arriscado!
Beijos

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
JoaoLynch disse...

a única coisa "imperdoável" no João Lopes é ser fã da Madonna, de resto sempre gostei de ler as suas críticas especialmente aquelas que incidiam aos filmes do David Lynch