sábado, 12 de janeiro de 2008

Pacheco - delírios e hipocrisias


Ainda a propósito da morte de Luiz Pacheco. Não deixa de ser profundamente irónico (e parece-me até: cínico) que a Assembleia da República tenha decretado um minuto de silêncio pelo desaparecimento do escritor. Parece que o Estado quer institucionalizar o Pacheco. Coisa mais absurda e hipócrita nunca se viu. O mesmo Estado que nunca manifestou a mínima preocupação por Pacheco. A haver vida noutro mundo, o autor de "Comunidade" deve estar a rir-se estupidamente desta pretensa honra oficial (uma certa imprensa afina pelo mesmo diapasão: como o Pacheco era um personagem marginal e dizia palavrões, há que lhe dar destaque pelo lado exótico da coisa). É desconcertante que um autor que foi tão provocador, escandaloso, irreverente, insubmisso, anti-clerical e detentor de uma costela anárquica, seja agora alvo de homenagens formais. Pensarão os engravatados da AR (os quais, aposto, ou não gostavam ou não conheciam o Pacheco) que é desta forma pasteurizada que se fazem homenagens a figuras tão marginais e fora do sistema? A hipocrisia política é bem capaz de mandar erigir uma estátua no Marquês de Pombal em "memória do célebre e magnânime homem das letras Luiz Pacheco"?

2 comentários:

Daniel disse...

Decretar um minuto de silêncio em honra de Luiz Pacheco é a pior coisa que é possível fazer; justamente Luiz Pacheco foi alguém que nunca, jamais, se calou quando devia falar, e que continuou falando sempre e quando quis, da maneira que quis e estando-se nas tintas para os outros. Esse acto é tanto nojento como aviltante, e mostra, enfim, as verdadeiras intenções das pessoas que nos governam: querem calar a voz do Pacheco - e a voz do Pacheco é a voz de todos os Pachecos que existem por aí espalhados por Portugal. Portanto, a única resolução a tomar é fazer exactamente ao contrário: falar e escrever, e continuar a falar sempre quando e como se quer, e só aí então é que poderemos fazer alguma coisa que se queira parecida àquilo que foi realmente Luiz Pacheco.

Saudações!

Ana Cristina Leonardo disse...

Se fosse só o Estado...