quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Andrei Tarkovski - O Escultor do Tempo


Quem é este realizador que é comparado, em dimensão artística, ao escritor Dostoievski? Quem é este cineasta que, em todo o seu percurso cinematográfico, efectuou um intenso mergulho na árdua e intrincada jornada rumo ao autoconhecimento e à mais elevada espiritualidade? Na História do Cinema houve poucos realizadores tão exigentes, inovadores e visionários como o russo Andrei Tarkovski. A sua obra cinematográfica é profundamente original, fruto de uma progressiva maturação artística obtida ao longo de três décadas e da decisiva influência cultural paterna (o pai, Arseni Tarkovski, era um importante poeta russo). No mundo do cinema, talvez se possa citar nomes da mesma estirpe como Ingmar Bergman, Akira Kurosawa, Robert Bresson, Carl Dreyer, Alain Resnais ou Luís Buñuel (Tarkovski admirava todos estes cineastas). Realizou apenas sete filmes (sete obras-primas?) ao longo da sua carreira, apenas sete longas-metragens que constituem a expressão máxima de um dos maiores criadores de imagens da segunda metade do século XX.

Homem de uma cultura erudita e abrangente (pintura, poesia, música, cinema, literatura, geologia), teve muitas dificuldades em trabalhar livremente fruto das pressões censórias das autoridades soviéticas. Por isso se exilou e procurou desenvolver o seu trabalho singular em países como Itália, França ou Suécia. Foi acusado de elitista e austero, mas insistia que eram as crianças que melhor entendiam os seus filmes. O seu cinema é um cinema de permanente confrontação dos sentidos, de depuração espiritual, de um formalismo estético sem paralelo, que pouco tem de entretenimento gratuito; a sua demanda prende-se com a procura do sentido para a arte, para a existência humana, num mundo cada vez menos preocupado com as questões culturais e mais com as questões da sociedade de consumo e do espectáculo. Conceitos como nostalgia, fé, simbolismo, sonho, lirismo, poética, sombra, meditação, arte, tempo, introspecção, mistério, subjectividade, metafísica, misticismo ou memória, são abordados recorrentemente nos filmes de Tarkovski. O cineasta fazia filmes “esculpindo no tempo”.

A sua filmografia é absolutamente ímpar em toda a história do cinema, tendo granjeado inúmeros prémios internacionais (Cannes, Veneza, Berlim): “Andrei Rubliev” (1966), “Solaris” (1972), “Stalker” (1979), “Nostalgia” (1983) ou “Sacrifício” (1986), são testemunhos de uma arte das imagens que deve tanto à pintura como à literatura. A mestria da realização (planos, movimentos de câmara, enquadramentos), a sua mise-en-scène (rigorosa e despojada), a utilização subtil da banda sonora e da sonoplastia (o som como elemento dramático), o soberbo domínio da fotografia (composição plástica da imagem), os argumentos sólidos (diálogos profundos, dramas envolventes), fazem de Tarkovski um autor de rara qualidade artística.

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